A prova era de matemática e era a antiga (nem tanto assim!) 4ª série do primário. Eu precisava acertar aquela questão de qualquer jeito. Isso mesmo, de qualquer jeito. Eu sabia que existia uma fórmula para resolver o problema, mas não lembrava por nada. Na luta para tentar lembrar, veio a dor de cabeça e a preocupação com o tempo escasso. Confesso que obter o apoio de um colega não estava descartado, mas não foi preciso. Comecei a fazer contas e fui resolvendo, na raça. Cheguei a um resultado que me deixou seguro. Entreguei a prova e agora era aguardar o tão temível resultado. Meu maior medo era de que Eduardo e Mônica não pudessem viajar porque seu filhinho estivesse de recuperação. Recebi o resultado, passei raspando. Na dita cuja questão, recebi apenas meio ponto e uma observação em vermelho: Não usou a fórmula. Para o meu azar, a minha professora não era empresária e não conhecia nada de gestão, porque se fosse, fatalmente diria: “Parabéns, acertou a questão e o que importa é isso! Funcionário padrão é aquele que gera resultado!”
Vivemos numa era onde a gestão insiste em ter uma visão consequencialista e finalística. O que mais ouvimos no seio das empresas é a busca desenfreada pelos resultados. Em alguns casos, testemunhamos uma lista interessante de valores quando de repente, o último valor é “foco no resultado”. Ora, mas qual empresa não precisa de resultados? Significa então que será necessário desfocar os demais valores e priorizar os resultados? Sim, é isso mesmo que vem acontecendo em muitas corporações. Alguns empresários ficam cegos pelo lucro, fazendo foco excessivo no resultado sem querer saber o como se chegou até este resultado. É assim que os escândalos acontecem, é assim que a reputação dos líderes cai do céu para o inferno rapidamente e as marcas têm a sua imagem arranhada. Somos medidos pelos resultados que geramos ou deixamos de gerar. A pergunta que não quer calar: resultados a qualquer preço?
Já não é de hoje que vivemos uma crise ética e moral. Os escândalos que possuem espaço fixo na imprensa são as evidências desta crise. E não pense que é somente na política não, os exemplos sobram: Eike Batista, Oscar Pistorius, Jon Jones e Anderson Silva. Eike gozou de grande prestígio, riqueza e sucesso, mas a qual preço? Anderson ganhou a luta, mas a qual preço? E aqui não quero antecipar o julgamento, apenas constatar o fato do escândalo. Não se engane, uma situação de corrupção nunca se apresentará como um risco iminente. Ninguém que corrompe ou é corrompido o faz pensando em ser descoberto e nos efeitos. A falsa percepção de vantagem e valor acaba cegando para os riscos.
Numa época que os resultados ofuscam o caminho, muitas pessoas lançam mão de formas duvidosas para alcançar o resultado tão desejado. Mas o fato notório que trazemos aqui é que a forma ao qual se obtém o resultado é determinante para garantir no tempo os efeitos do resultado. Note que a visão consequencialista só se preocupa com a forma quando alguma denúncia vem à tona, e aí começa a caça às bruxas, com objetivo de jogar no fogo aqueles que agiram de forma antiética. Tenho a impressão que o real motivo ao qual são jogados no fogo seja o fato de macularem o resultado obtido.
As empresas estão cheias de bombas de corrupção que poderão vir à tona a qualquer momento e colocar tudo a perder, ou a ganhar a depender da perspectiva. Pessoas com posições estratégicas vivem com medo de serem descobertas. O esforço diário consiste em fazer a manutenção da estética corporativa do seu avatar. E neste cenário, bons líderes estão sendo levados pelo vento do resultado a qualquer preço, sendo um passo para o caos. Os melhores resultados são aqueles que são sustentáveis, cuja forma podemos replicar sem receio de que venha a ser invalidado por ferir a ética.
Precisamos ter mais cautela ao desafiar as nossas equipes para o alcance de resultados. É fundamental que os padrões éticos e morais sejam colocados em evidência e cobrados pelos líderes. É essencial que equipes sejam formadas a partir de uma afinidade de valores. Líder bom mesmo é aquele que ensina a sua equipe a realizar boas escolhas ao ponto da sua opinião se tornar desnecessária. E as boas escolhas são balizadas por referenciais éticos e morais. Boas escolhas, tomadas a partir de filtros éticos e morais afastam situações de corrupção. E porque devemos evitar a corrupção? Simples, porque ela gera morte. A corrupção é o câncer da ética e dos valores morais. Ela acaba com a reputação das pessoas, mata sonhos e o pior de tudo, ela aniquila a confiança e autoestima. E pior coisa que pode acometer um ser humano é não acreditar mais em si mesmo.
Desconfie sempre que ouvir “Temos que conseguir isso de qualquer jeito ou de qualquer forma…”. Os negócios sustentáveis são realizados por pessoas de honra. Eu e você somos parte integrante desse sistema que nós mesmos criticamos e atiramos pedras diariamente. Está registrado no evangelho de João que um grupo de judeus legalistas denominados Fariseus queriam apedrejar uma mulher que tinha sido pega em adultério. Era a lei dos judeus. Jesus chegou e saiu em defesa da mulher e disse “Quem nunca pecou que atire a primeira pedra. E foram se retirando um a um, até que todos saíram.” Jesus não defendeu a prática daquela mulher, mas sim o poder de transformação do ser por meio do aprendizado numa situação de fissura ética e moral. E daqui tiramos muitos princípios de aprendizado para liderança, ao qual quero destacar dois:
1º A cura está no aprendizado.
Não se resolve um problema ético tacando pedra no infrator. Sem aprendizado não há cura moral, não há mudança ética. A esperança está na capacidade de se aprender no momento mais oportuno: o momento da dor. Somos reativos, é fato. A maioria de nós só procura um médico quando os resultados do exame trazem notícias duvidosas. No momento da dor gerada pela fissura ética é o melhor momento para se forjar o caráter de uma pessoa. O ferro é forjado no fogo, assim como o caráter. Líder, fique atento às oportunidades diárias para forjar o caráter da sua equipe, sendo certo de que a harmonia é obtida por um esforço diário e coletivo.
2º Só há aprendizado se houver quem ensine ao invés de julgar.
Já parou para analisar quantas pessoas você julga por dia? Julgamos a todo momento. É quase que automático e intuitivo. O julgamento está para a justiça assim como o ensino está para a mudança. As empresas precisam mais de líderes capazes de promover mudança ao invés de gastarem o precioso tempo julgando.
Líderes que buscam resultados de qualquer jeito, fatalmente terminarão junto ao grupo dos fariseus catando pedras para tacar no adúltero do momento. Até chegar o seu próprio dia. Aproveitar as fissuras éticas para promover o aprendizado é uma grande pedrada na cabeça dos fariseus de plantão. Afinal de contas, para tacar pedra um fariseu basta, mas para estender a mão e promover mudança aí precisa ser mestre, precisa ser líder de verdade.