Pedi a um grupo de crianças e adolescentes que criassem uma cena de Natal. Fizeram vários desenhos comuns, como árvores, carro do Papai Noel, as palavras “Feliz Natal”. Depois indaguei como seria o Natal de cada um. A maior parte delas me disse que seria “normal” como todo ano.
Inquieta com respostas tão vazias, perguntei de novo se eles não poderiam, então, sonhar com um natal diferente. Aí me deparei com outra resposta: “Eu já falei para meu pai que queria enfeitar a casa, mas ele disse que não podemos gastar dinheiro, mas que tentaria assim que a obra acabasse”. E de novo questionei: e se você criasse com os materiais que possui em casa? “Ah! Vai dar muito trabalho!”
Entre tantas impossibilidades e baixa produção, um adolescente apresenta a “Santa Ceia” sob nova configuração, colocando o Papai Noel no lugar de Jesus, com pessoas da família, os animais que ama e trazendo o sentido da união. Em um desenho simples, este adolescente me fez refletir sobre o quanto estamos esquecendo o verdadeiro “espírito de Natal”. Exceto por uma criança superdotada que marcou: “Eu acho que este espírito deveria perpetuar por todo o ano, afinal, para fazer valer tem que praticar.” Bela mensagem para todos nós: praticar!
Acredito que é o momento de grandes reflexões pois no momento atual baseamos nossas ações sobre um suposto sucesso que está fora de nós: objetos materiais e ações práticas. Erich Fromm, famoso psicólogo, costumava dizer que estamos enterrados no “TER”. Estamos criando uma geração ansiosa, porque não utiliza seus recursos cognitivos, afetivos e relacionais integrados, uma geração passiva observando o mundo pela tela, refletindo, mas distante do real. Uma geração que não se move, logo, não existe!
Não estamos mais vivendo na esteira do cartesianismo, na visão de fragmentos onde a razão é suprema. Nosso mundo oferece diversas linguagens, inclusive a virtual, mas deixamos de lado o “SENTIR” em detrimento de um “PENSAR RACIONALIZADO”. Isto gera pessoas em desarmonia consigo, com a organização de sua autoimagem, com o poder pessoal de conhecer e utilizar seus recursos internos, principalmente a inteligência que depende desta harmonia. Temos vivido a imaturidade pessoal e a imaturidade relacional entre pessoas como consequência da ausência de espaços construtivos entre seres humanos. É preciso espaços para “SER”, ainda anunciando Erich Fromm.
O empobrecimento mental, psíquico e espiritual é um dado gritante que depende da revisão de nossos atos frente à nossa família, ao nosso trabalho, à nossa vida. Pequenos detalhes fazem grande diferença. Que tal praticar?
1– Organize com a família a decoração de Natal – a cor, o sentido, os objetos que possuem e os que podem ser criados inclusive com reaproveitamento de materiais. É hora de organizar a casa, jogando fora tudo o que não vamos mais usar ou aproveitar. É hora de doar roupas e presentes! Novos espaços, novas possibilidades.
2– Organize a ceia de Natal com os gostos da família. Saia do tradicional e do comum. Surpreenda seus filhos e companheiros com um prato diferente. Cozinhe em família! Vários adolescentes me narraram a vontade de fazer um prato diferente, mas que as mães não permitem chegar na cozinha, ou por segurança, ou porque não querem a casa bagunçada. Casa arrumada demais é casa sem vida! Faça valer a pena o sentido de Natal e que esta data signifique realmente a felicidade pelas belas mensagens de Jesus;
3– Criem uma árvore de Natal diferente. Olhem em torno se não há alguma árvore ou arbusto para receber os enfeites símbolos escolhidos por seus membros. Não compre tudo e coloque sem a ação de todos. A família precisa distribuir valor a todos os membros. Até o brinquedo do bebê deve estar na árvore. A cada ano, mude a árvore, mude a forma, mude a ideia e crie um clima de mudança no psiquismo de todos;
4– Faça um “AMIGO OCULTO” diferente. Algumas crianças neste grupo criaram a cesta de desejos onde irão colocar um livro que já leram e podem doar, irão colocar uma barra de chocolate, balas e um sentimento para o colega. Esta ideia partiu de crianças que estão sendo trabalhadas em grupo para ampliar os canais relacionais e de organização de sua autoimagem. Percebam que conseguiram unir seus desejos com o cuidado ao outro.
5– Capriche no visual pessoal. Crie novas possibilidades mesmo que não possa gastar. Sempre temos em casa uma peça nova, um enfeite ou podemos customizar algo diferenciado. Na impossibilidade de uma peça nova, vá em busca de peças bonitas, mas dentro do seu orçamento.
6– Separe músicas de Natal e músicas que agradem a todos permitindo democraticamente que a música marque a diferença e o gosto de cada membro. Assim anunciamos que todos são importantes;
7– Não quebre o encanto do Papai Noel. Pode ser também Mamãe Noel. Entre na magia e sonhe. Para as crianças, o sonho do Papai Noel deve ser encenado. Já pensou em deixar marcas de farinha no chão? Já pensou em ser o Papai Noel da família? E, para os adultos, o sonho precisa ser resgatado pois move novas estruturas internas para atingir objetivos. Já são adolescentes? Escolha um bom filme e comece a noite discutindo valores, avaliando o ano, as ações positivas e as ações que merecem ser transformadas. Mais do que julgar, o momento é de avaliar e reformular. O ato de julgar paralisa. O ato de orientar e cuidar promove mudanças.
Uma outra sugestão é fazer o mapa da família durante o ano. Crie um porta-retratos ou um cartaz onde as belas experiências são mapeadas.
8– E os presentes? Ganhar e dar presentes é um ato generoso e amoroso quando sentimos vontade de investir em algo material para dar ao outro. O presente se torna o elo entre pessoas. Mas os presentes não precisam ser caros. Precisam ser ricos de significado e sentido.
Não é gastando o que não se tem, ampliando o crédito dos cartões que a outra pessoa vai amar você. As pessoas que amamos e que estão inseridas no contexto percebem as possibilidades. E, se alguma criança não consegue aceitar o que foi possível oferecer, será hora de uma boa orientação feita conjuntamente entre os pais e filhos. Na impossibilidade de uma conversa entre pais e filhos, é fundamental verificar quais os membros da família perpetuam este comportamento e hora de buscar ajuda de um neuropsicólogo. Este profissional reconfigura pensamentos, emoções e ações a partir do próprio sujeito e dos valores da família.
9– Tanto para organizar quanto para guardar, a família deve estar envolvida. Se não há uma equipe para a limpeza, a tarefa se torna de todos;
Que nosso Natal em tempos globais atenda verdadeiramente a missão de construir humanos capazes de cuidar de humanos! Um Feliz Natal!