Não há dúvidas sobre o fato de que a pandemia deixará sua marca nos mais diversos setores. Transformações que já eram previstas por muitos especialistas foram forçadas a acontecer – afinal, era mudar ou mudar, sem mais opções. Na construção civil, há alguns exemplos interessantes do que acredito ser tendência para o futuro e do que pode ter provocado grandes expectativas agora, mas não devem ter impacto significativo a longo prazo.
O primeiro temor é sobre o fim do aluguel. Boa parte dos proprietários já observam uma debandada de inquilinos. Muitas empresas sentiram que seus funcionários se adaptaram bem ao home office e decidiram adotar o trabalho remoto como algo permanente. Portanto, não faz sentido para elas pagar o caríssimo aluguel de um imóvel bem localizado – ou, pelo menos, não de todo o imóvel. Uma sala pode suprir as necessidades de espaço, não mais todo o andar de um prédio comercial. Da mesma forma, muitas pessoas voltaram para a casa dos pais ou se mudaram para apartamentos e casas menores, e com preços mais compatíveis com seus orçamentos, por dificuldades financeiras.
Esta, porém, é apenas uma questão de renovação de mercado. As pessoas não pararam de comprar carros por causa dos aplicativos de carona. Há sempre alguém que vá querer um modelo esportivo, para viajar para a casa na praia, ou um mais compacto, porque mora sozinho e não precisa de tanto espaço. Maiores ou menores, luxuosos ou mais acessíveis, fato é que este mercado sempre está pronto para atender aos mais diversos tipos de consumidores. E isso é algo que ainda falta à construção civil.
Grandes centros de construção, que gastam fortunas alugando espaços quilométricos, já começam a optar pela sublocação. Dividir aquele espaço enorme com um lojista parceiro é uma opção economicamente viável, pois fica mais barato para os dois, e também atende às expectativas dos clientes. A loja vira um cartão de visitas. Ao invés do home center vender móveis planejados, ele reduz seu preço de aluguel ao sublocar para uma loja de móveis. Pode ser que, daqui a um tempo, tenhamos um verdadeiro coworking de lojas.
É preciso enxergar o setor como um todo, e isso só é possível a partir de dados e informações. Se houve queda no número de compra de imóveis, por outro lado, a quantidade de reformas aumentou. Tudo é uma questão de equilíbrio e de saber analisar a situação e as tendências com um olhar mais analítico.
Boa parte das novidades desse momento vieram para ficar. A construção civil raramente dá um passo em falso – até por isso, ela caminha devagar. As transformações ainda são feitas de maneira gradual, por mais que a pandemia tenha acelerado esse processo. O que deve permanecer é a necessidade de atendimentos mais ágeis, como a possibilidade de fazer orçamentos de materiais pela internet e o delivery de materiais, e o relacionamento com o cliente a partir do digital. Se era difícil encontrar marcas e lojas de materiais de construção nas redes sociais, hoje esses contatos estão muito mais acessíveis.
A informatização do mercado é algo que sempre defendo. Afinal, é a partir de dados que são feitos os maiores investimentos. O proprietário de um imóvel precisa saber quanto se cobra de aluguel em determinada região, assim como é interessante para uma loja de materiais de construção saber que uma construtora está levantando um prédio. Essa troca enriquece todo o setor, permitindo que a indústria seja mais assertiva em sua produção, o comércio não venda produtos com preço inflacionado e o consumidor pague mais barato.
Por fim, é importante destacar o papel importantíssimo da construção civil como motor da economia. Por ter uma cadeia enorme de produção que envolve os três setores – indústria, comércio e prestação de serviços – este é um setor que merece ser valorizado. Por ele, se gera renda para diversas famílias, acelerando o consumo e fortalecendo as vendas. A construção de conjuntos habitacionais e casas populares, com incentivo do governo, pode ser uma forte alavanca para a retomada econômica pós-pandemia. Assim, poderemos sair mais fortes como país.